EIS QUE TRAGO O QUE SABE O NÃO MANIFESTO
A EXPERIÊNCIA MÍSTICA
A vida não são as palavras, pois tudo é vão quando se fala. Esta noção impressionante, não sei se me torna um sábio ou um solitário sem remédio.
A única eternidade em Proust está na Madeleine e ele, nessa fugidia experiência, rápida como um relâmpago, fora do tempo e da memória, viu-se, afinal, livre de recuperar qualquer coisa. A vida não existe na memória; repete-se nela.
A flor exala sempre seu perfume; você pode cheirá-la, sentir o aroma, ou não. Isso não faz nenhuma diferença para a flor.
O Eu é a maior interrupção, se me faço entender.
Nenhuma faca pode, ao cortar teu corpo já dilacerado, atingir quem és ; breve, o saberás.
Não é uma questão de ver-se a vida do lado de fora; é viver-se tal vida.
Há um segredo além do gesto, dentro do movimento do gesto que se dissolve no ar, no próprio mistério. Isso não se alcança: Isso se é.
Dá-me a calma subjacente que sinto no ar sozinho-bem acompanhado das flores com elas mesmas.
Ah, que minha mente adormeça, finalmente, e que eu possa, finalmente, começar a viver. Enganam-se os que pensam que falo da morte. Falo da vida real, além da mente.
Ao manusear um livro de Alan Watts, “O Zen e a Experiência Mística”, encontro uma anotação minha, datada de 24-7-1995. Não sei mais, sequer, se já a reproduzi, alhures, mas o faço agora, novamente ou não:
“Foi em uma manhã e eu caminhava à beira-mar; até certo momento, meus pensamentos iam e vinham, como é próprio da mente. Eu andava sobre o calçadão da praia e sentia toda a brisa em meu corpo.
“O frescor me tocava a pele sem interrupção, por assim dizer. Então, em dado instante, já não existia nenhum pensamento, somente a sensação da brisa me tocando a pele. Perdi meu ego, tão rapidamente, como se não houvesse jamais existido qualquer unidade ( este que se chama “EU” e que “faz” a maioria dos seres humanos).
“Havia só um presente magnífico, nenhum futuro e a morte era uma perspectiva no futuro. Vivia como um fenômeno natural, no presente que eu sentia. Senti o orgasmo de se viver, plenamente, a verdadeira natureza íntima do ser humano, que se mistura à natureza primordial do Cosmos.”
Eu já escrevia toscamente, então, como faço agora. No entanto, vale como testemunho de que a experiência mística não é sinônimo de permanência .
Tenho, às vezes, o sentimento de que tudo é um imenso desperdício, ao olhar o homem no seu ato de “viver”.
O homem, especificamente.Tudo o mais que dele se destaca, por assim dizer, e que,no entanto, é ele, precipuamente,o crescer da relva, o movimento dos galhos nas árvores, o rio que segue, os animais outros em seu mundo absoluto, tudo parece inundado de extraordinária justeza. Mas o homem, não. Como não sabe de sua própria e verdadeira natureza, parece viver em total desperdício de si mesmo.
Tenho, também às vezes, o que Alan Watts chama de “volúpia em comunicar”, a propósito daqueles que têm experiência mística e a querem transmitir aos outros. Tipo:”Como vocês podem perder o verdadeiro espetáculo,como passar por aqui e não tê-lo apreciado?” Filmes não seriam necessários, ou, por outra, seriam somente filmes de pura felicidade. Quem iria ao cinema ver aquilo que já tem,obviamente, dentro de si?
MU AID IERES ODIL
LIN DE VARGA